SONETO PARA TI I
Por que matastes meu coração criança?
Por que vingastes em mim tuas dores?
Não dei-te miríades de gestos como flores?
Por que me feristes com o aço de tua lança?
Não entendo tanta maldade, tanta loucura
Contra quem se deu sem pesar limite algum
Envenenastes minha vida como a nenhum
Dos que te usaram deixando em tua língua angustura
Fui o rato na boca da serpente!
Esmagado, morto, engolido!
Com os meus olhos suplicando, olhar perdido
Sem entender, reagir, numa entrega indescente
Pulei da prancha, pus-me à fogueira, demente!
Mas sei que mesmo morto não serei eu o vencido...
SONETO PARA TI II
Não consigo mais andar, para mim andar é suplício
Respirar cansa. Sorrir? Absurdo impensável!
Já não resisto ao que se tornou inevitável
Quando corto o ar que separa o chão do precipício
Meus olhos decoram os desenhos dos passeios
Que molhos com lágrimas de tristeza e pavor
Porra! Me perdi entre teus seios!
Que ocultavam coração sem amor
Coração doente, vingativo e frio
Coração que bombeia vácuo. Sim em ti é possível
Tamanha maldade plantada em teu vazio
Agora que merda faço? Pedra, corda, pescoço, ponte, rio?!
Morro, resisto, alimento o estupôr irascível?
Ou cedo, caio, morro, apodreço invisível?
SONETO PARA TI III
Parte de mim quer te matar literalmente
Parte de mim te ama e me entrega vencido
Parte de mim é veneno, sangue, ódio inclemente
Parte de mim se ajoelha e me confessa perdido
Parte de mim quer tirar minha própria vida
Parte de mim me parte ao meio, santo e bandido
Parte de mim chora enquanto a outra, perdida
Parte, correndo para o abismo sem prurido
Parte de mim te esgana, esquarteja
Parte de mim, imbecíl, te benfazeja
Parte de mim, sóbria, te sepulta em cova rasa
Parte de mim te salva, outra te arraza
Parte de mim te deseja
A outra desposa a morte, se casa
SONETO PARA TI lV
Contigo fui coletor de dores
Coveiro de sonhos, expectativas
Bode expiando teus tantos desamores
Contigo aprendi a morrer para que tu vivas
Contigo meus olhos se tornaram água
Salobra, molhando as sombras e as flores
O câncer que me apodrece apodrece menos que a mágoa
De ser tão desimportante, vil servo de teus horrores
Meus desejos foram tão pequenos! Tão bobos!
E os matastes, um a um, com frieza espantosa
A mão que decepastes era a mão que te entregava uma rosa...
Uma praia, uma noite de amor, de arroubos
Nada mais! Mãos dadas, sexo de lobos
Esqueci. Morro porque esqueci de tua língua mentirosa
SONETO PARA TI V
Eu sou o nada, ilusão que criei de mim
Quando muito verme, corpo apodrecido
Sem formol, azedo, corrompido
À espera do descanso, da liberdade, do fim
Dia em que toda a dor se acaba
De nada vale tanto amor, desejo, libido
Se o céu se torna chumbo e desaba
-inocente arrestado aos infernos, banido
Meus passos desconexos, sem destino
Meus olhos parados, sem viço
Eu inerte, imovediço
-engolindo teu escarro imagino
meu velório solitário, teu amor postiço
Eu sepultado em teu intestino
SONETO PARA TI VI
À mesa fria do necrotério
Corpo amarelo, enrijecido
Há um defunto de olhos abertos, fedido
Preparado para o cemitério
Viveu como morto-vivo, funéreo
Infeliz, traído, humilhado
Amando víboras, Bolenas, acorrentado
A toda sorte de tristezas, mistério!
Amou insanamente, apaixonado
Mergulhou suicida, indecente!
Mas seu grande amor foi cruel, inclemente
E o afogou num mar de amor falsificado
O fez pagar por suas desgraças friamente
Deu-lhe por lar a rua. Morte ao indigente!
SONETO PARA TI VII
Queria tanto escrever sobre teus gozos, loucuras
Sobre o cheiro de tua pele, nossa fantasia
Escreveria sobre nossas taras, luana a vadia
Escreveria sobre coisas que para outros são obscuras
Falaria da lavanderia, da cozinha, triste alegria
Falaria de nossa última loucura, em março. Auguros
Que restavam dias, mal sabia que seriam escuros
Mal sabia de nossa morte. Não cria
Queria escrever sobre a Paixão, o quartinho dos fundos
Mas o que me move são pensamentos imundos
Eu degradado ao Portal, amante indigno, horrendo
Dores que não suspeitara, dor dos vagabundos
-até março, teu vassalo, prostituto, sofrendo...
Há coisas de mais em mim doendo...
SONETO PARA TI Vlll
Queria que minha caneta escrevesse sozinha
Sem precisar do combustível porco de meus temores
Sem se alimentar de meu sangue, desamores
Queria que fosse autônoma, mesquinha
Que ela tomasse para si minhas dores
Meus tormentos, torturas, desgraças
Escrevesse por si meus ódios, ameaças!
E me deixasse em paz, longe dos horrores
Que me fazem escrever, excretar
beber cicuta, curari em mil taças
Eu maldito! Torpe! Rei das trapaças!
Que iludem a morte como um avatar
De mim mesmo, num périplo sem graças
Mas é ilusão, desejo tolo posto às traças..
ESTUPIDEZ
Creio que estupidez seja a palavra que guia meus passos
Construindo o que me envolve, bílis em que me banho
Azedume feito de enganos, fotografia em sépia de abraços
Ausência, distância mesurável apenas por meus lanhos
E o sangue escorre entre as palavras que escrevo, malditas
Merda perceber que mesmo corpos unos somos estranhos
Como se jamais hovessemos proposto espectativas, almas aflitas!
Desoladas ante segredos, degredos, mistérios tamanhos!
Posto, que seja assim, que a terra engula o cadáver dos sonhos
Famélica que é por engolir o que ainda me resta
Cinzelando em nossas peles desenhos medonhos
Então "adeus" talvez seja o que o destino gesta
Na perversidade do tempo e seus demônios risonhos
Que nos têm por convivas nesta sangüínea festa
QUIMERA
Cansei da melancolia absurda dessa vida
Quero um novo tempo, novo auguro
Beliscar, que seja, a bunda do futuro
Assassinando essa famélica tristeza
E com a parca força que 'inda me há conjuro
Nada há de me afastar dos amores
Que persigui com a fúria de tamanhas dores
E que ora com insipiente paz procuro
Porque há de multiplicar-se como as flores
Multiplicam-se, findo o inverno, à primavera
O amor sepultando os meus rancores
Inaugurando em meu caminho nova era
Novo aeon brandindo vida, destemores
Deste que escreve do estômago de uma Quimera
AGORA?
Eis que minha morte é teu derradeiro presente
Meus sonhos sepultados na frieza de teu peito!
Dei a vida e à morte colho tua atitude inclemente
À frieza dos teus olhos, o laço desfeito!
Dei o que jamais te deram, mas nem sente
À grandeza de cada atitude teu coração não é afeito
Preferes quem humilha destrata e mente!
Preferes a desgraça, humilhação, enjeito!
Dei minha vida para não perderes a tua
Mas eis que a loba devorou minh'alma
Na torpeza fria e nua
Será que há em ti o que se diga alma?
Será que há em mim coisa que não seja tua?
Agora? Sinto em minha face tua mão que espalma!
CHARLES
Este é para ti, caro hipopótamo de pantufas
Grão-mestre do orgulho, falastrão por natureza
Vate que de amor entende bulhufas
E tem o ódio como forma de beleza
Não há em ti, afora o peso, o que seja grandeza
E pouco me importam as verdades que arrufas
Se tens o espírito emporcalhado pela grandeza
Patética para quem come lodo e arrota trufas
Para meu prazer bastam um bom bife-à-milaneza
A alegria dos que me são caros, a mulher que amo
Mas para ti qualquer prazer causa estranheza
Como dizes: "prazer? É a vingança que tramo"...
Pois meu caro, carregues ao menos esta certeza:
Espana o mofo de tua alma! Ouça o que clamo!
DEFUNTO ANDANTE
sou defunto andante e nauseabundo
Verme sob os pés da tríade nefasta
Sou quem pés e alma arrasta
Para os bueiros infectos do mundo
Sou aquele que dor nenhuma basta
Quando muito me faz fecundo
À miséria secular que em um segundo
Ao vômito dos cães me arrasta
Sou a estupidez manifesta e plena
A ironia da justiça, o anticristo
Riso sacrílego cortando a cena
O sangue podre de Mefisto
Posto à boca de maldita hiena
Quem de tão podre se resume nisto.
GUANO
Sou náufrago em mar de guano
Infecto como os sinais de meu futuro
Abortado em pedaços de engano
Escarrados pelo útero de meu auguro
Sangrando, hemofílico, aguardando a morte
-já não habitam sonhos em meu mundo escuro
nem há sangue em meu próximo corte
apenas catre mortuario frio e duro
Sinto às narinas o azedume da finitude
Libertação que temo deste mundo impuro
-vislumbro a campa e o ataúde
Mas morro ímpio e ímpio esconjuro
Ao deus hipócrita, assassino e rude
E à finitude meu corpo gasoso juro
EU
Eu sou a vida e por vida o esplendor da morte
Sou paixão e ira, quintessência da entropia
O carrasco, a sordidez, o inocente que espia
Metástese de deus, lâmina que desenha o corte
Tenho em mim a dor da humanidade
Todos os seus gritos, toda a agonia
A solidão e a completude, quem destroi, quem cria
Ilhas de esterco no oceano da sujidade
Da mulher que se crê santa sendo vadia
Do homem de bem apodrecido pela maldade
De mim mesmo que me creio tanto!
E não passo de engano vomitando a verdade
Não passo de verme coberto pelo manto
Da poesia e sua crueldade
SONETO MALDITO
É fátua a felicidade em minha vida
Como o tempo que dos relógios escorre
Farta é esta dor lancinante, ganida
Que arrebenta as horas de quem morre
De que, por idéia mais descabida
Duvida, mesmo de sua existência
-pura ilusão que de tão "garrida"
Sepulta-me à cova da pestilência
Não por saber o nada como futuro
Mas por tê-lo como presente
Em meu coração "inveros-símio" auguro
O que apenas um imbecil sente:
Não há na vida algo tão escuro
Quanto descrer-me, inclemente
VASILHA
Sou a vasilha onde o destino escarra
Quem desimporta, o imbecil, cretino
Homem sem dons, da morte o hino
Pescoço posto à lâmina da cimitarra
A merda, o lodo, vômito do desatino
Aquele em quem a repugnância crava sua garra
-não há felicidade em mim que deus não varra
nunca houve respeito por meu coração menino
Então danço, vítima de um ritual sagrado
Danço meu réquiem , danço moribundo
Dança o homem, no destino, seu fado
Dança o tolo neste espetáculo imundo
Para deleite de um deus desfigurado
Leproso, repleto de escárias, nauseabundo
SILÊNCIO
No silêncio infecto que há entre nós
Vermes banqueteiam-se em teu lado escuro
Enquanto segue o féretro de teu futuro
No mistério de haver gritos onde não há voz
No hermetismo estúpido das covardias
Desprezas o que no mundo há de mais puro
Tornando teu coração pétreo, duro
Incapaz de derramar-se em alegrias
Pois te vale mais o medo que as fantasias
-a realidade que negas te é senhora
e faz-te morta às noites frias!
Mas qual agiota a vida te cobra a mora
Qual moiras sabes dos fios podres com que fias
Teu futuro, que logo chamar-se-á agora
TEUS OLHOS
Há em teus olhos a consagração do medo
Tânatos exultante, solene, triunfante altivo
Por ter feito Eros subjugado, sob o crivo
Da nova lei instaurada: em degredo
Ilhado, solitário... eis o adjetivo!
Solitário! Refém de tu enredo
Conspurcado por teu engano ledo
Mas, contudo, ainda vivo
Conspirando contra as mortes, subversivo
Construindo istmo que o leve ao continente
Do que em ti vive submerso, inconsciente
Escorrendo entre tuas coxas, redivivo
Renunciando às tuas mortes, teu temor abortivo
Algo que apenas teu olhar desmente
TU
Tu és inesgotável coleção de desejos e medos
De armadilhas, fascínios... renascimento e morte
Segredos, fantasias, dados lançados à sorte
Criança autofágica e seus brinquedos
Tu és a liberdade reprimida em teu seio
Senhora das tramas, teias, enredos
Quem faz dos sonhos pesadelos azedos
E a cada ousadia sucumbe ao freio
Por desejos outrens guias tua vida
É o medo das sentenças que te rege a atitude
E o quanto tal covardia torna tua vida rude!
quiçá haja força outra que te mude
Que te faça ver nas loucuras tua saída
Reconhecendo à liberdade valor essencial à vida
Sou a vasilha onde o destino escarra
Quem desimporta, o imbecil, cretino
Homem sem dons, da morte o hino
Pescoço posto à lâmina da cimitarra
A merda, o lodo, vômito do desatino
Aquele em quem a repugnância crava sua garra
-não há felicidade em mim que deus não varra
nunca houve respeito por meu coração menino
Então danço, vítima de um ritual sagrado
Danço meu réquiem , danço moribundo
Dança o homem, no destino, seu fado
Dança o tolo neste espetáculo imundo
Para deleite de um deus desfigurado
Leproso, repleto de escárias, nauseabundo
SILÊNCIO
No silêncio infecto que há entre nós
Vermes banqueteiam-se em teu lado escuro
Enquanto segue o féretro de teu futuro
No mistério de haver gritos onde não há voz
No hermetismo estúpido das covardias
Desprezas o que no mundo há de mais puro
Tornando teu coração pétreo, duro
Incapaz de derramar-se em alegrias
Pois te vale mais o medo que as fantasias
-a realidade que negas te é senhora
e faz-te morta às noites frias!
Mas qual agiota a vida te cobra a mora
Qual moiras sabes dos fios podres com que fias
Teu futuro, que logo chamar-se-á agora
TEUS OLHOS
Há em teus olhos a consagração do medo
Tânatos exultante, solene, triunfante altivo
Por ter feito Eros subjugado, sob o crivo
Da nova lei instaurada: em degredo
Ilhado, solitário... eis o adjetivo!
Solitário! Refém de tu enredo
Conspurcado por teu engano ledo
Mas, contudo, ainda vivo
Conspirando contra as mortes, subversivo
Construindo istmo que o leve ao continente
Do que em ti vive submerso, inconsciente
Escorrendo entre tuas coxas, redivivo
Renunciando às tuas mortes, teu temor abortivo
Algo que apenas teu olhar desmente
TU
Tu és inesgotável coleção de desejos e medos
De armadilhas, fascínios... renascimento e morte
Segredos, fantasias, dados lançados à sorte
Criança autofágica e seus brinquedos
Tu és a liberdade reprimida em teu seio
Senhora das tramas, teias, enredos
Quem faz dos sonhos pesadelos azedos
E a cada ousadia sucumbe ao freio
Por desejos outrens guias tua vida
É o medo das sentenças que te rege a atitude
E o quanto tal covardia torna tua vida rude!
quiçá haja força outra que te mude
Que te faça ver nas loucuras tua saída
Reconhecendo à liberdade valor essencial à vida